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5.3.16

MANEL DA LENHA - PARTE XXVI



 foto do google
Ainda nesse mês  de Agosto, o Manuel construiu  com a ajuda do irmão João que era electricista, uma Galena. Era um aparelho muito rudimentar, mas que dava para ele ouvir à noite as notícias e os relatos de futebol ao domingo à tarde. Mal sabia ele que no mundo há muito havia televisão e a NBC iniciava nesse ano a TV a cores.
No início de Setembro, a filha mais velha do Manuel foi matriculada na escola na Telha. As aulas começavam em Outubro e todas as crianças com sete anos eram matriculadas. A garota nascera em Setembro fizera os sete anos há pouco. A escola, uma sala única, numa antiga vacaria era mista. Nela rapazes e raparigas, desde a primeira à terceira classe, com uma única professora. Era um bocado distante do barracão mas a miúda estava habituada ao caminho desde pequena. E depois havia outros garotos filhos do pessoal que vinha para a safra do Bacalhau.
 Manuel era um apaixonado por futebol e o F. C. Porto o seu clube do coração. Assim sendo, foi para ele uma grande alegria o 1º de Dezembro desse ano, pois foi nesse dia a  inauguração do novo estádio do Benfica, mais tarde conhecido pelo estádio da Luz. No jogo de inauguração, o Porto bateu o Benfica por 3-1.
No ano seguinte, com a década de cinquenta a meio`, enquanto a Europa tentava a todo o custo curar as feridas da Segunda Grande Guerra, em Portugal, às dificuldades da vida, que nunca fora fácil para o povo, juntava-se  a repressão cada vez mais feroz do governo Salazarista.
Em Fevereiro desse ano, chegou ao Barracão outro cunhado do Manuel. António era um rapaz espigado e brincalhão. Tinha saído da terra na esperança de arranjar uma vida melhor. Dias depois trabalhava na Seca. Também por esses dias a filha mais velha trouxe da escola uns visitantes indesejados. Uma praga de piolhos que antes que eles dessem conta já tinham infestado as três crianças e os tios. Manuel foi à drogaria e comprou uns pacotes de DDT que a mulher espalhou nessa noite, nas cabeças de todos e cobriu depois com uma espécie de turbantes feitos com bocados de lençol velho, e todos foram dormir assim. No dia seguinte as cabeças foram lavadas e os piolhos desapareceram.
Só muitos anos mais tarde, ela veio a saber, que esse processo poderia ter matado os filhos e os irmãos, por intoxicação.
Ainda nesse mês, depois de um violento temporal,  o poço que o Manuel abrira no Verão anterior abateu. As tábuas velhas não aguentaram tanta chuva. Manuel jurou a si próprio que abriria outro, mas desta vez de modo a que não se desmoronasse.

22 comentários:

aluap disse...

Em certa época parece que houve uma tal enchente de piolhos que se conta na minha terra que as crianças da escola usavam lenço e os piolhos subiam da cabeça para o lenço!
Lembro-me de um pó para matar piolhos, mas acho que não era um pó assassino!
Beijinho.

chica disse...

Acompanhando e gostando de tantos acontecimentos! beijos,chica, lindo domingo!

Dorli Ramos disse...

Oi Elvira,
Estou me perdendo no seu blog.
Seguindo...
Beijos
minicontista2

Elisa disse...

Acompanhando sempre as suas palavras!
Beijinho

Zilani Célia disse...

OI ELVIRA!
FICAMOS POR AQUI HOJE E TE DIGO AMIGA QUE ESTOU ADORANDO, ÉS MUITO CAPAZ E UMA ESCRITORA DE MÃO CHEIA.
ESPERO A CONTINUAÇÃO.
ABRÇS

http://zilanicelia.blogspot.com.br/

Isa Sá disse...

a passar por cá para acompanhar a história!

Isabel Sá
http://brilhos-da-moda.blogspot.pt

Beatriz Pin disse...

Este texto lémbrame a miña infancia, a escola na miña aldea que era desas características. Tamén me gusta esa maneira de escribir tan abundante en detalles e lembranzas doutros tempos. Parabéms por tan boa "pluma" e por ainda ter tempo de visitar outros blogs amigos. Grazas por deijar seu comentario no meu post do río Rato. O Miño que nos une e nos separa nunca será um obstáculo para entendernos senón algo bo que compartilhar. Unha aperta.

Unknown disse...

Peguei piolho 3 vezes na minha infância, lembro-me bem. O pó era terrível, Baygon.
Gostei imenso do seu texto.
Beijo*

Existe Sempre Um Lugar disse...

Bom dia, Historia real que me faz lembrar a minha infância e a minha família que foi vitima, como igualmente foram milhões de portuguesas da ditadura Salazarista, pela primeira vez li na sua escrita "a repressão feroz do governo Salazarista" gostei de ler, é bom recordar para não mais voltar.
Feliz Domingo,
AG

Magia da Inês disse...


Você é uma adorável contadora de história que nos prende a atenção.
Quando criança eu também peguei piolho na escola e foi usado na minha cabeça muito vinagre e boldo que é uma planta muito amarga.
Bom domingo!
Boa semana com tudo de bom!


✿゚⎠
╰✿‿⎠

Anete disse...

Bom domingo, Elvira.
Outras novidades! A dos piolhos é severa!!
Um abç

Blog da Gigi disse...

Abençoado domingo!!!!!!!!!! Beijos

Zé Povinho disse...

Foi bom ouvir falar da galena e do DDT, coisas que já só existem na nossa memória...
Abraço do Zé

Gaja Maria disse...

Tantos contratempos.. Beijinho Elvira

Janita disse...

Vidas trazidas de novo aos tempos actuais pela sua mente brilhante, Elvira, e que tanto me apraz ler.

Ainda não há muitos anos atrás o meu neto apanhou piolhos na escola e foi um Deus-nos-acuda!! E eu que pensava essa praga de parasitas tivesse sido erradicada, fiquei pasmada quando na farmácia soube que havia um surto de piolhos. Veja se pode!!...

Um abraço e boa semana!

Emília Pinto disse...

Não conhecia o nome " galena " para esse aparelho concebido com tanta imaginação e perícia. Antigamente tinha de ser assim, ou se fazia, ou não havia. Quanto aos piolhos, era assim mesmo... não havia muitas soluções e muito menos informação e as mães coitadas valiam-se do que tinham à mão. Elvira, continuarei a acompanhar este Manuel da lenha e entretanto, aqui te deixo um beijinho e votos de uma boa semana com muita saúde. Até..
Emilia

Rogério G.V. Pereira disse...

Três apontamentos distintos: o primeiro, relativo à Galena, nem eu sonhava que essa engenhoca que em miúdo também enjorcara tinha esse potencial... o segundo, nem tinha ideia de o Benfica tivesse tido tal tareia... terceiro, com o DDT podia de facto ter havido grande grande prejuízo...

Pedro Coimbra disse...

Essa praga dos piolhos era um horror.
Quando andava no Colégio via-os passear na cabeça de umas colegas minhas.
Nojo!!
Boa semana

Portuguesinha disse...

Uma duvida: porque não foi o manel viver para as casas de pedra, como os compadres? Varandas foi e já tem uma familia maior

Mariangela l. Vieira - "Vida", o meu maior presente. disse...


Piolhos é dureza Elvira!
A vida é assim, sempre com uma coisa ou outra!
Abraços e uma boa semana!
Mariangela

Laura Santos disse...

Olhe, eu nunca tinha ouvido falar em Galena! :-)
E é muito curioso que nessa escola os meninos e as meninas estivessem juntos, talvez por ser apenas uma escola e uma professora. No Alentejo iniciei a escola também com outras meninas e meninos, mas quando vim para Lagos, a minha escola só tinha meninas, os rapazes frequentavam a escola ao lado. E os piolhos eram algo de comum na altura.
xx

Rosemildo Sales Furtado disse...

Cesteiro que faz um cesto, faz um cento. Se fez o primeiro poço, com certeza fará o segundo.

Abraços,

Furtado.